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Poucas coisas geram tanta polêmica no mundo da Capoeira como a palavra “Mestre”.
A primeira pergunta que geralmente um capoeirista faz ao outro, curioso em saber quais conexões ambos têm em comum é: “Quem é seu mestre?”, seguida de: “Ele foi formado por quem?” ou “Qual é o seu grupo?”.
Entre os mestres é praticamente unânime o discurso sobre a necessidade de um capoeirista se formar dentro de uma escola ou grupo de Capoeira e a rejeição pelos capoeiristas “free-lancers”, avulsos, mesmo que estes joguem, toquem e cantem muito bem. É natural, portanto, que o próprio título “Capoeira sem Mestre” provoque em muitos um incômodo, pois a noção de pertencimento na Capoeira está muito associada ao fazer parte e ser aceito numa comunidade que compartilha valores comuns.
Não pretendemos entrar no mérito sobre o que dá autoridade para que qualquer um se julgue no direito de dizer se o outro é mais ou menos legítimo por ter ou não mestre. Isso é assunto para outro texto. Neste aqui vamos discorrer simplesmente sobre um fenômeno que existe, um fato real e inexorável: existe Capoeira sem Mestre. Existe há muito tempo e sempre vai existir.
Existe Capoeira sem Mestre há muito tempo
A história da Capoeira pode ser dividida em dois momentos, como defende Nestor Capoeira:
1. A era dos valentões
Manduca do Praia, Besouro Preto, Nascimento Grande ou outros desordeiros famosos não têm a alcunha de “mestre” no imaginário coletivo da Capoeira e quando os capoeiristas modernos se referem a eles utilizam somente seus nomes.
2. A era dos educadores
Já Bimba, Pastinha, Waldemar e a geração que logrou dar visibilidade positiva à Capoeira são respeitosamente chamados de “Mestre”, sendo uma gafe se referir a estes sem o devido título antecedendo seus nomes.
Histórico
A transição de uma era à outra se deu na primeira e se acelerou na segunda metade do século 20. Como a era dos educadores é um fenômeno recente que segue em permanente mudança, ainda não se chegou a um modelo fixo de ensino-aprendizagem que contemple todas as variáveis derivadas de seu crescimento e sua difusão pelo mundo. Se hoje em dia é uma quase unanimidade a ideia da necessidade de pertencimento a um grupo com aulas presenciais nos moldes da escola tradicional, historicamente nem sempre foi assim.
Ensino à distância na Capoeira
Desde 1907, pelo menos, existem tentativas de se ensinar Capoeira sem a presença de um Mestre, transmitindo saberes por outros meios, como o livro apócrifo cuja assinatura parece se referir à “Ofereço, Dedico e Consagro à Distinta Mocidade”.
Detalhe: este livro foi publicado quando os Mestres Bimba e Pastinha ainda eram crianças!
ODC: 1907
Em 1928, quando os Mestres Bimba e Pastinha eram ainda homens jovens, vem o livro de Zuma, cujo detalhamento o transforma em referência nacional em relação à Capoeira.
1928
Em 1945, no fim da 2a Guerra Mundial, quando mal a Capoeira havia saído do Código Penal e as escolas de Capoeira dos Mestres Bimba e Pastinha ainda eram fenômeno recente, sai o livro de Inezil Penna Marinho, um ícone da Educação Física Brasileira.
1945
Seguindo esta tradição de ensino à distância, em 1961 vem o livro de Lamartine Costa, cujo título foi usado como inspiração deste texto:
1961
Na década de 80, Nestor Capoeira publica seu Pequeno Manual do Jogador de Capoeira. Este livro já nasceu escrito em inglês, com o título “The Little Capoeira Book”, voltado ao ensino à distância, desta vez para estrangeiros:
1981
As décadas seguintes veem o nascimento dos vídeos tutoriais em VHS, com diversos mestres gravando movimentos e cursos para serem comercializados. Na sequência, o VHS vira DVD e o DVD, mp3. Filmes como “Esporte Sangrento” e videogames como “Tekken” serviram de referencial pedagógico para milhares de jovens no exterior, que não tinham acesso às fontes primárias de conhecimento e aprendiam como podiam, consumindo a informação que chegava pelas TVs.
Eddy Gordo – Tekken
Esporte Sangrento
Com o advento da internet a velocidade da informação se exponencializa, fazendo verdadeiras comunidades de ensino-aprendizagem por meio das redes sociais, com capoeiristas transmitindo informação 24 horas por dia em todo o planeta.
Sempre vai existir Capoeira sem Mestre
Existe um motivo simples para acreditarmos que sempre haverá Capoeira sem Mestre: o sucesso da Capoeira! Conforme se espalha pelo mundo e conquista mais e mais adeptos, o número de alunos cresce em progressão geométrica, enquanto o número de mestres formados se mantém sempre em velocidade menor.
Cada vez que a Capoeira chega em uma pequena cidade do interior do Brasil profundo ou num longínquo país asiático, novos alunos são incorporados à segunda coluna. Neste meio tempo, pouquíssimos mestres são formados.
Pedagogia do século 21
As novas tecnologias já fazem parte da realidade da geração que iniciou a Capoeira depois de 2005. Facebook, Youtube e até Whatsapp são mecanismos para transmitir informação. Se há 20 anos era raro um capoeirista ter mais de 10 fitas K7 com canções, hoje temos canais de música no Youtube com milhares delas. Se há 10 anos era comum o capoeirista proibir qualquer tipo de registro e filmagem em seus eventos, hoje em dia os próprios mestres levam celulares às rodas e publicam os jogos em transmissões ao vivo.
O Instituto Brasileiro de Capoeira-Educação – IBCE
Pensando nesta nova realidade foi lançado o Instituto Brasileiro de Capoeira-Educação (IBCE), um órgão difusor de metodologias online, voltadas aos professores de Capoeira no Brasil e no mundo.
O 1o Curso de Capacitação Profissional oferecido pelo IBCE será lançado no dia 27/03/2017. Este curso será uma especialização no Método de Capoeira-Educação Brincadeira de Angola, metodologia criada pelo Mestre Ferradura e continuamente aprimorada há mais de 20 anos.
O curso será democrático, terá informações de alta qualidade e o que é melhor, totalmente GRATUITO.
Quer saber mais?
Clique neste link e inscreva-se para receber informações em primeira mão sobre o Curso de Capacitação Profissional em Capoeira Infantil, no Método de Capoeira-Educação Brincadeira de Angola.
A partir desta semana virão muitas informações também pelo Canal Abeiramar.tv e pelo Portal Capoeira. Fique ligado! Axé!
Comente abaixo o que você acha do assunto e compartilhe este texto com seus amigos!
Um abraço!
Mestre Ferradura
Texto de Mestre Ferradura
Imagens: quase todas encontradas na internet. Agradecimentos especiais a Jerohen Rouxinol pela ajuda com as imagens faltantes.[:]
12 comentários sobre “[:pb]CAPOEIRA SEM MESTRE[:en]CAPOEIRA SEM [:]”
Top!!!!!! Grande Mestre Ferradura, espalhando conhecimento!!!!
Boa desenvoltura nexte texto. Mesmo o mestre Nestor Capoeira escrevendo um livro para aquêles que poderiam aprender de longe, o livro foi escrito por um mestre o que consequentemente dá validade ao que foi publicado.
A capoeira nasceu de uma necessidade, a liberdade! Sendo ela uma ferramenta lúdica de libertação, como pode através dos anos alguns se apropriarem da mesma. O que quero dizer é que sou capoeirista e sou livre para me espressar através da arte que me foi passada com a mesma concepção(a de liberdade).em face do esposto, digo que este trabalho é de fundamental importância para o resgate da ideia de que a capoeira é luta de libertação, mas também como dizia o saudoso Mestre Pastinha, ” capoeira é tudo o que a boca come”
Parabéns Mestre Ferradura.
Muito obrigado pela válida infirmação Mestre Ferradura. Axé
Instrutor Quiabu
Grupo Hinga Da Alma
Holanda
No intuito de melhorar as informações apresentadas aqui e no vídeo compartilhado na net, gostaria de tecer apenas um pequeno esclarecimento,dentre outros que acho que ainda possam ser revisitados: o livro do professor Lamartine inicialmente saiu com o seguinte título: CAPOEIRAGEM – A arte da defessa pessoal brasileira. O título Capoeira sem Mestre somente saiu depois que uma editora comprou os direitos autorais e fez uma coleção com o subtítulo sem mestre. O autor, como acredito que já saiba, fui duramente criticado, e mais recentemente publicou uma nota contando sobre este fato e falando que o livro não substituía a figura do Mestre de Capoeira. Poderia enumerar mais algumas considerações de ordem histórica, mas acredito que esta já é uma singela, mas sincera forma de ajudar no processo de informação clara e mais crítica da história da capoeira. Atenciosamente, Joel
Isso mesmo. Muito esclarecedora esta parte. O assunto com este título, me reportou direto ao livro.
Mas é real a colocação do Ferradura. Axé e Luz! Inez.
Capoeira sem Mestre é desrespeitar as raízes e origens da nossa própria história. Buscar democratizar a Capoeira e torna-la acessível para um maior número de pessoas é sim importante, mas desvincula-la ao Mestre é, ao mesmo tempo, descaracteriza-la.
Não consigo conceber esta separação.
Sou de Salvador, pratico Capoeira, e digo com todas as letras: meu Mestre é im-pres-cin-dível para a minha formação como capoeirista.
Tentar separar a Capoeira da figura do Mestre é tentar enfraquecer um movimento de Luta, que começou diante de remotos abusos Coloniais mas que perduram até hoje, mascarados sob inúmeras outras formas.
Não podemos reduzir a Capoeira à simples movimentos corporais, ela é luta, é História, é música!
Ela é consciência!
Desmerecer a figura do Mestre é, simplesmente, negar a nossa história!
EU DIGO UM NÃO À CAPOEIRA SEM MESTRE!!!!!!!!
Otimo ler tudo isso.
Obrigado pelo articulo. Para min è muito importante ler isso.
Blza, Ferradura!
Otimo texto, bem escrito, (aparentet) “simples” (algo q eh o sonho d mt gente q escreve), e com as ideia extremamt bem encadeadas.
Em ralacao ao numeromestres/numeropraticantes, gostaria de fazer algumas consideracoes.
Eu penso q o cara q da aulas (professor treinel, corda X, etc.) substitui a figura do mestre. E geralmt esta sob a tutela de um mestre. Entao isto ja desestabilisa, ate certo ponto, a validd da comparacao numprat/nummestres.
E, ao meu ver (q eh um palpite pois n temos numeros p realizar uma afirmativa de valor), o numero de “professores” aumentou mais q o numero de novos alunos, proporcionalmt, nos ultimos 25 anos.
Por exemplo: nos ultimos 25 anos, no meu grupo existem 6 capoeiristas dando aulas atualmt. Entao onde tinhamos 1 (eu), agora temos 7.
No entanto, o mercado de alunos n cresceu 7 vezes. Ou seja: tem mais professor por cabeça (de aluno) q antigamt.
Inclusive, vemos a dificuldd d novos bons professores viverem numa boa apenas d Capoeira. Algo q rolou entre, aproximadamt, 1970 e 2000, na grande maioria dos casos.
Mas este raciocinio n invalida em nada o seu otimo texto.
P encerrar direi q eu, particularmt, gosto mt da ideia do Mestre (apesar d mts poucos de nohs, os mestres, poder realmt encarna-la). Tv p ter sido aluno do mestre Leopoldina, ter conhecido os mestres Bimba e Pastinha, e conhecido, convivido, e ate jogado com mts dos q vieram depois – os mestres Canjiquinha, Caicaras, Waldemar, Ateniloetc.
Acho, q p o Imaginario, a figura e a realidd do Mestre eh uma boa.
Faz parte da estrutura das culturas arkhe (como nos explicou o Muniz Sodre0, da qual a Capoeira, Candomble, Umbanda, Samba pertencem.
Mas isto n impede q eu concorde c vc: eh claro q existe capoeira sem mestre, e q, querendo ou n, o ensino utilisando as ferramtas contemporaneas (Internet, etc.) ja eh uma realidd. E os mais capazes (e os outros tb) devem, ao meu ver, se esmeirar e dar sua contribuicao na construcao d novos modos e contextos de ensino. Algo q os Mestres do passado fizeram em relacao as “novas” ferramentas do tempo deles (discos, aparecer em filmes-documentarios, livros e folhetos impressos, etc.).
As novas maneiras e ferramentas de ensino, no meu pensar, n vao substituir, nem tirar o lugar do Mestre.
Falai demais. M empolquei depois d ler teu texto.
Abracao, Ferra. Nestor.
[email protected]
Oi Ferra, sou eu de novo.
Assisti ao video e curti.
Parabens p IBCE!
“Os Educadores” (Bimba em diante), em oposicao ah geracao anterior dos “Dizordeiros”, foi um termo cunhado p nosso querido amigo Frede Abreu, q infelizmt nos deixou ha pouco. Eu gosto mt do termo.
Recomendo fervorosamt os livros do nosso iluminado, quase fosforecente, Frede Abreu.
Td d bom, Nestor.
tem um rapaza que diz que é mestre, mais não tem nenhum documento que ele prova que é. ele dá capoeira na doida, abri uma roda e quem, vai chegando vai brincando. correndo o risco de contusão e etc